quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Devaneios

Hoje aconteceu algo muito estranho. Eu me dei conta de que devo mudar, mas eu estou tão ferida, que não sei como. Foi a primeira vez que eu chorei na rua. Foi a primeira vez que eu corri tão rápido, que não senti os próprios pés. Tudo o que eu queria era chegar em casa e me abandonar no abraço de alguém.
Se há algum interesse, você deve estar curioso para saber o que aconteceu, meu leitor, por isso vou contar. Tudo começou na segunda-feira, anteontem, dada a hora em que escrevo: madrugada de quarta-feira. Acordei e como de costume fiz meu ritual matinal, saí atrasada e vi um conhecido, amigo de uma amiga, que nem sei o nome, mas mesmo assim dei-lhe um sorriso. E devo dizer que de longe foi um sorriso forçado, pois eu estava realmente alegre por tê-lo visto. Afinal, é tão raro ver um rosto conhecido por aqui. Mas ele pouco entendeu e virou o rosto. Na verdade, aquilo não me deixou triste ou furiosa, ele poderia não se lembrar de mim... Talvez minha memória seja um pouco melhor do que a dele. No entanto, eu percebi que há três meses eu ando por essas ruas sem acenar para uma pessoa sequer. E não foi o rapaz que me deixou mexida, mas sim o fato de eu sorrir para o rapaz.
Eu sinto falta de andar pelas ruas de Campina e encontrar um conhecido a cada esquina, um amigo almoçando com a família no shopping, todas as pessoas que falam da sua vida no fim de semana enchendo a cara em algum estabelecimento de felicidade instantânea, essas coisas. Eu não tenho isso aqui.
Tudo se desenvolveu ontem, terça-feira. Intervalo entre as aulas, peguei um livro e comecei a ler. A leitura estava bastante agradável e eu me distraí do que estava à minha volta. Mas, não sei o motivo, levantei a visão por um segundo e tornei a levantá-la. Não havia ninguém. Eu estava lá, mais um vez sozinha. O ar faltou. Comecei a lembrar de todas as coisas do passado e percebi que, por piores que tenham sido, sempre havia alguém. Mas hoje, não, e eu nunca me senti sozinha assim. Todo meu corpo se remoía, implorando pelo término da aula. Eu queria sair dali. Minha cabeça estava girando e quando eu vi, já estava andando pela rua olhando para meus pés. Que tem os pés? Como vim parar aqui? Não sei, estava um pouco desligada. Como atravessei todas essas ruas? A aflição me possuiu por completo. Decidi me acalmar, mas era tarde demais. Quando olhei para a esquerda, eu o vi. Eu ia acenar para você, mas... você não existe. E naquele momento eu queria muito que você desaparecesse e parasse de me atormentar, sua alucinação importunadora. Eu estou tão cansada de ver pessoas que não existem!
Andei por mais alguns metros. E avistei uma outra pessoa. Eu sabia que a conhecia! J..., claro que era ele. Ele olhou para mim, olhou dentro dos olhos. Eu sorri. Mas ele me ignorou. Será que ele também não se lembra de mim... e como lembraria, eu era um criança. Devaneio? Nunca saberei. Se minha mente foi capaz de me pregar uma peça antes, ela sempre será capaz de aplicar novamente.
Eu era uma pessoa invisível. Eu estava ali e elas simplesmente não me viam. Comecei a chorar e a correr. Eu queria que alguém me visse, estava desesperada. Só há uma coisa que não consigo entender: durante minha pressa eu só pensei em uma pessoa. Eu não entendo, porque nunca a conheci.
Pisei em casa. "Chegou cedo?!". Eu não estava mais invisível. Acalmei-me, me abandonei no sofá e fingi que nada aconteceu. Não quero mais sair daqui.

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